Feijão acebolado

Feijão é bom. Feijão é a base da alimentação da vegana. Feijão é a proteína do proletariado. Feijão (leguminosas em geral) é a solução pra que comer animais se torne obsoleto. E tem mais.

-Ele fixa nitrogênio no solo. Plantado em rotação melhora o rendimento das outras culturas e diminui a necessidade de fertilizantes.

-Pra produzir 1kg de lentilhas são necessários 1250 L de água. Pra produzir 1kg de carne de frango: 4325 L. 1kg de carne de vaca: 13 mil L (fonte: FAO)

-Ele absorve carbono, reduzindo o efeito estufa.

-É rico em proteínas de qualidade, de fácil digestão, pobre em gordura e cheio de fibras.

-Essas fibras controlam o nível de açúcar no sangue, apesar dele ser rico em carboidratos, dando sensação de saciedade por mais tempo (ótimo parceiro pra diabéticas).

-É a proteína mais acessível economicamente. Em períodos de crise, quando a população não consegue mais comprar animais, o feijão continua no prato. Junto com o fiel arroz, é uma proteína completa, com todos os aminoácidos essenciais.

-É o alimento que pode tratar ao mesmo tempo a subnutrição e os problemas de saúde ligados a dietas pobres. É um guerreiro na luta contra a fome e a fome oculta.

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Depois que ela se foi

Ontem eu estava limpando meu computador, que não para de me enviar mensagens dizendo que não tem mais espaço pra nada por aqui, quando achei essa foto feita há exatamente um ano.

Eu sempre tive medo de cachorros. Um velho trauma de infância, nada grave, mas suficiente pra ter me feito temer aproximação com cães durante quase toda a minha vida. Até que Nina entrou pra família. A história de como ela chegou até nós é bonita, então vou contar.

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3 de janeiro

Eu não sei como foi o ano pra vocês, mas 2021 me deixou sentindo como se eu tivesse caído de um caminhão em movimento. Detalhe: a queda foi no meio de um cruzamento movimentado, então nem deu tempo de parar e conferir se estava tudo bem. Já tive que levantar, bater a poeira da bunda e correr pra não ser atropelada. Porque apesar dos meus pedidos encarecidos, 2022 não quis esperar e já está aqui. Eu não estou pronta, mas bora lá.

Em 2021 a situação de saúde da minha mãe, que tem Alzheimer, piorou e estive no Brasil duas vezes. Foram muitas horas com uma máscara FFP2 na cara, atravessando o oceano de cá pra lá e de lá pra cá. Quarentenas em cada ponto de chegada. E impossibilidade de visitar as amizades e familiares que moram em outras cidades. Daqui a um mês estarei no Brasil novamente, mas fico, mais uma vez, só em Natal. Dependendo da situação, quem sabe chego até Recife? 

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A fórmula do arroz de forno

Eu acredito cada vez menos em receitas e mais em “fórmulas”. Já compartilhei a fórmula da sopa e da salada-refeição aqui, mas como a gente não ganha amigues com salada (quem viu os Simpsons vai entender), hoje vim falar de uma fórmula quase mágica que vai limpar sua geladeira, produzir uma refeição nutritiva em pouco tempo e impressionar as gatinhas (e amigues). 

Não é segredo nessa internet que eu não sou a fã mais entusiasmada de arroz. Já me recomendaram inclusive procurar ajuda psicológica por causa disso (ah, as coisas estranhas que me escreviam no IG…). A verdade é que acho o bichinho sem graça. Não por acaso eu adoro risotto e arroz de forno, pois são versões “com graça” desse cereal. Quando misturo arroz com legumes e um molho, a cuíca muda o tom.

Como falei, não se trata exatamente de uma receita, mas de uma fórmula. Não se deixe intimidar pelo número de frases nas instruções. O processo é extremamente simples e juro que você só vai precisar ler tudo uma única vez. Ao entender o princípio, nunca mais será necessário voltar aqui pra seguir as instruções. E esse é um dos objetivos principais do meu trabalho no blog: ensinar a cozinhar de uma maneira emancipatória e incentivar a autonomia alimentar de vocês. 

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Pra se organizar e fortalecer o movimento

Hoje a pauta é: como fortalecer o veganismo popular e se organizar dentro do movimento vegano. Bora lá. 

Vocês sabiam que nos dias 27 e 28 de novembro aconteceu o segundo ENUVA, o Encontro Nacional da União Vegana de Ativismo? Foi todo on-line (a pandemia nos obrigou) e gratuito, reuniu pessoas de diferentes países e renovou nossa esperança. Bem no espírito da UVA. Se você perdeu as mesas/conversas, ou se viu e quer rever, tá tudo no nosso canal do YouTube

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O que não dizer pras mães

Acabo de voltar do aeroporto, onde fui deixar minha amiga Mariana, que estava me visitando aqui em Paris. Ela é a minha amiga mais antiga, além da primeira lá de Natal a vir me visitar aqui na França e essa foi a razão do meu sumiço aqui do blog nas últimas duas semanas. Eu estava levando ela pra conhecer Paris, mas também compartilhando um pouco da minha vida aqui. Logo no primeiro dia levei a bichinha pra uma ocupação, onde eu tinha uma reunião pra escrever (a muitas mãos) um livreto sobre antiespecismo e luta decolonial com um coletivo antispecista e anarquista aqui da periferia. À partir daí foi só aventuras! 

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Biodiversidade e produtos vegetais ultraprocessados


Essa semana a ocupação que também serve de base pro nosso coletivo anarco recebeu caixas e mais caixas de hambúrguer vegetal que iriam pro descarte. Falei sobre comida de descarte, e como isso alimenta não só as camaradas do coletivo, mas também as pessoas ao nosso redor, nesse post. Além da comida que pegamos regularmente (frutas e verduras da feira, todo tipo de alimento transformado que pegamos do descarte de supermercados) duas vezes por semana, de vez em quando uma montanha de alguma coisa que acabaria no lixo chega até nós. Umas semanas atrás foram 2 toneladas (sim, literalmente) de cogumelo orgânico congelado. Semana passada foram centenas de quilos de hambúrgueres vegetais, também congelados. Eram hambúrgueres feitos de proteína de soja com beterraba, temperos e alguns aditivos. Provei pela primeira vez ontem e o sabor é tão ruim que agora não sei o que fazer com o enorme saco de hambúrguer no congelador. 


Enquanto eu tentava tragar o intragável (pra que o jantar não acabasse no lixo), me vi pensando, mais uma vez, na obsessão geral com hambúrgueres vegetais e no mantra do veganismo liberal (“Quanto mais produtos veganos industrializados, melhor pros animais.”). Já escrevi longamente sobre como essa visão liberal do veganismo vai contra os objetivos do movimento antiespecista nesse post e nesse post . Mas hoje eu queria chamar a sua atenção pra algo que é frequentemente ignorado nessa discussão: a questão da biodiversidade.

Moqueca de caju, arroz da terra, feijão verde, farofa de couve e bolinho de macaxeira
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Comida como ferramenta de ‘conversão’

Durante os primeiros anos de veganismo, acreditei que oferecer pratos veganos deliciosos pras pessoas ao meu redor seria a porta de entrada delas pra causa animal. Talvez eu tenha sentido essa responsabilidade ainda mais forte porque cozinho profissionalmente. Então não perdia nenhuma oportunidade (aniversários, reuniões de família) de passar horas (às vezes dias) preparando menus, comprando ingredientes e cozinhando pra impressionar as não-veganas. Nos jantares onde cada convidada leva um prato, eu levava 4 e era sempre a mais cansada, a que trabalhava mais, a que gastava mais com ingredientes… As pessoas comiam minha comida, sim, e adoravam. Porém minhas preparações vegetais dividiam espaço nos seus pratos com animais e seus derivados. Nunca ninguém deixou de comer o animal assado, ou a sobremesa entupida de leite condensado, porque tinha pratos veganos deliciosos na mesa.

Quiche de cogumelo e espinafre, usando esse método
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Sabemos construir também. E plantar.

No último dia em que eu estive na ocupação dos Jardins Operários de Aubervillers teve uma reunião do coletivo de defesa dos jardins.  Eu saí da reunião frustrada pela maneira como a pauta principal da reunião tinha sido conduzida e, principalmente, pelas dificuldades constantes que enfrentamos quando construímos uma luta com um grupo de pessoas vindas de horizontes tão diferentes. Eu viajaria pro Brasil dali a dois dias e ao me despedir das camaradas pedia a todas que seguissem resistindo, pois eu queria ver a ocupação de pé quando voltasse. Foi a última vez que eu vi aquela terra coberta de árvores, legumes e frutas.

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Creme de tapioca e coco com abacaxi caramelizado

É verdade que na cozinha as coisas mais simples podem ser as mais difíceis de fazer. Tapioca, por exemplo, é uma delas. Depois que você aprende, se torna a coisa mais natural do mundo, mas até chegar nesse ponto você vai precisar suar um pouco. Repare que se a receita for extremamente simples (no caso da tapioca, com apenas um ingrediente), cada detalhe faz diferença. Nessa categoria de receitas, é mais sobre técnica. E prática é tudo que você precisa pra dominar a técnica. Infelizmente essa parte (a prática) não pode ser terceirizada.

Já a receita de hoje faz parte de uma categoria diferente. Sim, leva tapioca. Não a comida de café da manhã à base de goma fresca (ou polvilho hidratado) e feita na frigideira, mas sim os pequenos grãos irregulares de polvilho que também chamamos de “tapioca” (veja a foto mais abaixo). E também tem uma lista de ingredientes enxuta, com apenas três elementos (no máximo 4). Mas a parte complicada dessa receita foi encontrar as proporções exatas e o modo de preparo pra atingir a textura que eu procurava. E a boa notícia é que quem fez a parte difícil desse trabalho foi essa que te escreve, logo você não terá que fazer esforço nenhum.

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Escritos pra lembrar que estamos no mês da visibilidade lésbica

Agosto é o mês da visibilidade lésbica no Brasil e todo ano eu escrevia um post sobre o tema no Instagram. Mas o Instagram desativou a minha conta por lá (entenda o ocorrido aqui), então o post desse ano será aqui. E olha que feliz: escrever no blog significa que quem decide o número de caracteres sou eu e poderei publicar um texto do tamanho que o coração mandar. Como eu já escrevi bastante sobre vivência lésbica, lesbofobia e a alegria de ser lésbica por lá, e que esse material foi deletado junto com a minha conta, resolvi trazer uma parte pra cá. Seria uma pena perder as conversas que tivemos por lá e que tocou e fez refletir muita gente. Então você vai encontrar aqui reflexões e relatos pessoais que postei nos stories, textos curtos que estavam no feed mais alguns parágrafos inéditos.

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Almoços

É uma história que aconteceu há muitos anos, mas nunca esqueci. Eu estava no Sertão, visitando uma tia. Eu tinha me tornado vegana há pouco tempo e comer na casa de familiares ainda causava uma certa tensão. Não do meu lado, mas do lado da família, que não sabia mais o que cozinhar pra mim. Eu repetia que bastava fazer o de sempre: feijão, arroz, macaxeira, tapioca, cuscuz, batata doce… Sempre repito que o Nordeste é o melhor lugar do mundo pra ser vegana, pois a base da nossa cultura alimentar é vegetal. Mas lá estava eu, na cozinha da tia, na hora do almoço, depois dela ter me dito, mais uma vez, que não sabia o que cozinhar pra mim. Ela tinha preparado feijão verde, arroz, batata doce e macaxeira cozidas, salada crua e maxixe. Também tinha preparado uma galinha. Quando terminei de encher o meu prato, que estava abarrotado de comida e lindamente colorido, minha tia olhou pra ele com cara de tristeza, suspirou e disse: “Achou alguma coisa pra colocar no prato, minha filha?” 

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Feijão de mãe

Esse texto é sobre duas coisas diferentes, mas que se encontram no final. 

Uns dias atrás eu estava reunida com boa parte da minha família, numa casa de praia aqui do lado de Natal. Eu estava preparando o almoço com a minha cunhada e discutíamos sobre o que nós consideramos como essencial em termos de conhecimento culinário. Concordamos que qualquer pessoa no nosso território (o Nordeste) deveria saber preparar o essencial da nossa cultura alimentar: 1- feijão, 2- arroz, 3- cuscuz e 4- tapioca. Assim a pessoa garante sua autonomia alimentar no café, almoço e jantar. O resto (legumes refogados, salada, uma pasta pra passar na tapioca) também é importante, tanto pra ter uma alimentação diversificada quanto pra garantir refeições saborosas, mas deve ser construído em cima dessa base. Isso deve ser adaptado em função da sua cultura alimentar, obviamente. Tapioca não faz sentido pra todo mundo e talvez aí onde você mora o seu “essencial” seja diferente. 

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Tudo vai mudar (anúncio importante)

A vida tem dessas ironias. 

No último post contei que há alguns meses as tarefas da militância tinham se multiplicado de tal modo que eu já não conseguia produzir conteúdo no Instagram nem aparecer aqui no blog com a frequência que eu gostaria. Eu estava aguentando o tranco porque sabia que era uma situação temporária, pois no início de julho eu viria pro Brasil e, deixando as tarefas lá em Paris, eu teria mais tempo pra compartilhar receitas e histórias nos dois canais que uso pra fazer isso (IG e blog). 

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Bilhete pras pessoas que apoiam o meu trabalho

Ano passado tomei coragem e lancei uma campanha de financiamento contínuo no Apoia-se Era algo que eu pensava em fazer há tempos, pois seguir produzindo conteúdo (receitas, artigos, reflexões, entrevistas) aqui e no Instagram exige bastante tempo e eu sempre tinha que escolher entre seguir fazendo isso (trabalho não remunerado) ou usar meu tempo fazendo outras atividades que me permitissem pagar os boletos e colocar o tofu na mesa. A campanha de financiamento contínuo foi a maneira que encontrei, por enquanto, de seguir servindo minha comunidade e ao mesmo tempo ser remunerada pelo trabalho feito.

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Saudade de casa

Felizmente daqui a exatamente um mês estarei no Brasil novamente. Fazendo comida nessa cozinha, deixando recados pra galera da preguiça nos azulejos, cuidando da minha mãe, passeando toda tarde com ela, minha tia e sobrinha e voltando pra casa com as mãos cheias de frutas colhidas pelo caminho. Quer dizer, em julho não tem caju nem manga, né?

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Jardins da Comuna – Ep 5

Uma visita aos jardins com Lucas

No último episódio eu dei a palavra à algumas das jardineiras e jardineiros que cultivam a terra nos Jardins Operários de Aubervilliers. Aquelas falas precisaram passar por mim, que fiz a tradução e hoje eu queria que vocês ouvissem diretamente um dos jardineiros que fala Português.

Começamos a conversa no lote dele e seguimos papeando enquanto passeávamos pelos jardins. Foi difícil fazer esse episódio, pois naquele dia as máquinas entraram nos jardins, as maquinas que vieram executar o plano de destruição de 4mil m2 das hortas, que serão substituídas por um centro aquático, ligado à uma piscina de treinamento pras Olimpíadas de Paris de 2024. 

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Molho de amendoim e gengibre

Eu tinha planejado publicar essa receita semana passada, mas a situação de violência colonial israelense na Palestina ocupada explodiu novamente e desde então falar de qualquer outra coisa se tornou absurdo. Quem me acompanha no Instagram viu que compartilho informações e artigos por lá diariamente, na maior parte do tempo traduzidos de outras línguas. É um trabalho intenso, mas a Palestina não deixou de estar no centro da minha militância quando eu saí de lá.

Então vamos fazer assim. Por hora, passem no meu Instagram pra acompanhar os acontecimentos na Palestina. E sigam as outras pessoas/coletivos/mídias de confiança que recomendo por lá. E aqui, focaremos na comida, pelo menos por enquanto.

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