Durante essa temporada em Natal minha irmã Lu (a do melhor bolo de laranja do mundo) me apresentou uma receita da pasta de grão de bico com amendoim que passou a aparecer com muita frequência no meu café da manhã. Lu a chama de “hummus cubano”, pois aprendeu a fazer essa pasta em Cuba. Lá as pessoas contaram que como tahina (pasta de gergelim) é rara e cara, elas usam um ingrediente abundante na ilha: amendoim. Daquelas ideias geniais que fazem você pensar: “Por que eu não pensei nisso antes?” Obrigada, compas cubanas!⠀
Em Cuba o pessoal segue o modo de preparo tradicional, trocando apenas a tahina por pasta de amendoim. Quando voltou de Cuba, Lu começou a fazer assim em casa e acabou inspirando uma amiga daqui do RN a ir mais longe, usando o amendoim inteiro. Essa amiga deixa o grão de bico de molho com amendoim (torrado e sem pele), depois cozinha os dois juntos na pressão. Assim o amendoim fica macio e pode ser triturado até virar creme. Lu usa 1/3 de amendoim pra 2/3 de grão de bico (cru). Depois faz tudo igual, dosando os outros ingredientes de acordo com o gosto da freguesa. Dá pra usar só o amendoim e grão de bico, caprichando no azeite (dentro do hummus), já que a textura e sabor melhoram quando a quantidade de gordura aumenta. Mas essa pasta fica perfeita mesmo usando o amendoim inteiro junto com a pasta de amendoim.
Antes que me perguntem se fiica com gosto de amendoim, deixa eu responder que sim, obviamente. Se você não gosta de amendoim, sugiro que faça outra receita. Opções não faltam na seção “patês, cremes e pastas” desse blog (clique na página “Receitas” e procure lá) .
E antes de ir pra receita, deixa eu dar umas explicações sobre “hummus”.
Sempre que falo sobre essa comida tão popular na Palestina (e nos países vizinhos), chove perguntas sobre a pronúncia/grafia da palavra. Dependendo do país árabe, a primeira vogal é pronunciada “u”, “o” ou quase “a”. Segundo ponto: o “m” é duplo porque é pronunciado de maneira enfática (hum-mus), mas tudo bem se você falar um “m” simples. O que não é tudo bem é achar que o “h” é mudo (“umus). Não é. Lembrando que isso não passa de uma transcrição fonética da palavra em Árabe, já que essa língua tem um alfabeto diferente. O original é, na verdade, حمص
Então escolha a primeira vogal que preferir (descobri hummus na Palestina e como falam “u” sempre chamarei esse prato de hummus), fale um “m” duplo ou simples, mas não esqueça de pronunciar o “h” como o “r” de “rato” e lembre que é uma palavra paroxítona (rúmus ou rômus).
E, mais importante ainda: “hummus” significa “grão de bico” em Árabe, assim como a pasta feita com ele. Nunca tem confusão porque se você chegar num restaurante no Oriente Médio e pedir um prato de hummus todo mundo vai entender que você quer a pasta, não o grão. Inversamente, se você entrar num mercado e pedir 1 kg de hummus vão entender que você quer um saco do grão, não da pasta. Óbvio, né?
Então bora respeitar a semântica da palavra (e a língua Árabe) e parar com essa história de “hummus de lentilha/feijão/beterraba/abóbora”! Não existe! Seria a mesma coisa que dizer “feijoada de grão de bico”. Chamem de pasta de X e fim de conversa. Hummus, só de hummus (grão de bico).
“E por que você está chamando essa receita de ‘hummus cubando’, então?”
Mesmo não sendo tradicional, não é sem sentido chamar essa receita de “hummus cubano”, ou de “hummus com amendoim” (o que, na tradução, seria “grão de bico com amendoim”). Já “hummus de lentilha” é semanticamente impossível, pois significa “grão de bico de lentilha”. Entendeu?
Hummus cubano (pasta de grão de bico com amendoim)
Essa receita faz uma quantidade pequena de hummus. Sinta-se livre pra dobrá-la se quiser hummus pronto na geladeira durante toda a semana.
1 xíc de grão de bico cru
1/3 xíc de amendoim torrado, sem pele
2 col. sopa de pasta de amendoim (pura, sem açúcar)
2cs de suco de limão (ou a gosto)
1 dente de alho picado (o tamanho fica a seu gosto)
Sal e pimenta do reino
Azeite pra servir
Uma pitada de summac (sumagre) ou páprica doce, pra decorar (opcional)
Deixe o grão de bico e o amendoim de molho em bastante água por 12 horas (de um dia pro outro). No dia seguinte descarte a água do molho e cozinhe os dois em água nova, com sal, até o grão de bico ficar bem macio. Uso a panela de pressão, pois grão de bico, se for cozido sem pressão, demora muito e vai usar todo o gás da sua cozinha. Reserve um pouco da água do cozimento.
No liquidificador, bata o grão de bico/amendoim cozidos com todos os outros ingredientes, menos o azeite e o summac. Acrescente colheradas do líquido de cozimento, até atingir a consistência deseja (cremosa e encorpada). Prove e corrija os temperos de acordo com o seu gosto. Sirva regado com azeite e, se quiser, polvilhado com summac (ou páprica doce).
Guarde o hummus na geladeira, em um recipiente fechado. Se conserva vários dias na geladeira.
Oi Sandra! É sempre um prazer sempre te ler!! É a primeira vez que comento aqui. Sua “receita” me deixou a vontade para contar uma peripécia: quando não tenho tahine, só o gergelim cru e me bate aquela vontade de comer hummus, eu pego a quantidade de gergelim pra minha receita, tosto o gergelim na frigideira e bato o gergelim tostado com os outros ingredientes e posso te afirmar que fica muuuito bom!! Não sei de onde tirei essa ideia, mas a gambiarra fica muito boa (pro meu paladar né) e me salva nestes dias.
A necessidade é a mãe da criatividade 😉
Em Cuba possui pouco grão-de-bico, porque um dos motivos é o bloqueio econômico estadunidense. Nesse comentário vou escrever como o fim da União Soviética prejudicou Cuba, sobre o bloqueio estadunidense a Cuba e os impactos do bloqueio econômico no veganismo em Cuba.
I) Cuba depois do fim da União Soviética, se tornou um país mais prejudicado porque o bloqueio econômico estadunidense passou a afetar mais o país. Quando existia a União Soviética, a União Soviética comprava o açúcar do país a preços maiores que o de mercado; União Soviética era um país populoso, que se tornou em 15 países, então, cada país que surgiu com a queda da União Soviética decide se irá ou não irá exportar para Cuba.
A União Soviética era o mais industrializado dos países socialistas.
II) O Bloqueio econômico estadunidense a Cuba não é só entre EUA e Cuba, mas ele é algo extraterritorial porque ele incide nas relações econômicas entre Cuba e outros países.
a) Se um navio aportar em Cuba, ele tem que ficar 6 meses sem aportar em um porto dos EUA. Então isso encarece os produtos cubanos, então em quase todas as vezes Cuba importa através de navios cubanos.
b) Relativo ao motivo anterior; isso faz com que Cuba tenha menos combustível e por isso que muitos produtos da agricultura não conseguem chegar até as cidades.
c) Se um produto industrializado (eletrônico/eletrodoméstico, alimentício) fabricado em qualquer país tiver uma certa porcentagem de matéria-prima (açúcar, níquel) cubano, ele não pode ser exportado para os EUA.
d) Se um produto industrializado (eletrônico/eletrodoméstico, alimentício) fabricado em qualquer país, tiver uma certa porcentagem de matéria-prima (metais) estadunidense, ele não pode ser exportado para Cuba.
e) Os EUA proíbem os bancos de qualquer país de fazerem empréstimos para Cuba; por isso, os EUA multam os bancos de qualquer país que emprestarem dinheiro para Cuba.
III) O Veganismo em Cuba é mais uma coisa prejudicada pelo bloqueio econômico estadunidense. Vou escrever quatro exemplos sobre isso:
1)O bloqueio dificulta a conexão de internet em Cuba. A Internet é importante para o veganismo, porque através dela um vegano pode saber do saber mais sobre o veganismo, como ler/assistir receitas (de comidas, de produtos não-alimentícios como desodorante) veganas.
2)O Bloqueio dificulta bastante as exportações de outros países para Cuba; então a importação de trigo (países sul-americanos como Argentina e Uruguai são grandes exportadores desses itens) por Cuba é dificultada por causa do bloqueio. Com o trigo dá para fazer seitan (que é uma carne de glúten).
3)Cuba por ser um país de clima tropical produz bananas, porém, inclusive o consumo de bananas em Cuba é prejudicado por causa do bloqueio. A importação de petróleo por Cuba é dificultada por causa do bloqueio, então no país existe menos combustível disponível para levar vegetais (como as bananas) para as áreas urbanas. Com a banana, é possível fazer leite vegetal e carne de casca de banana.
4)O bloqueio dificulta a industrialização e isso também dificulta o veganismo em Cuba.
a)Indústrias químicas: Se houvessem mais indústrias químicas em Cuba, o país poderia produzir mais produtos não-alimentícios (como xampu, pasta de dente, desodorante, detergente) veganos (que não tenham ingredientes de origem animal e que não são testados em animais).
b)Indústrias alimentícias: Por causa do bloqueio, Cuba tem menos matéria-prima/tecnologia para fazer produtos industriais veganos que imitem produtos de origem animal (como leite vegano, queijo vegano, manteiga vegana). Lógico que o vegano não deve depender desses produtos, mas eles podem ajudar pessoas que estejam em transição para o veganismo.
c)Geladeiras: Se houvessem mais indústrias eletrônicas, o país poderia produzir mais geladeiras. A Geladeira é um dos eletrodomésticos mais úteis para veganos para conservar os vegetais; alguns veganos comem apenas comida crua (são conhecidos como crudívoros), eles não têm forno e fogão, mas possuem geladeira.
Bibliografia sobre o bloqueio econômico estadunidense a Cuba.
BLOQUEO: LA GUERRA CONTRA CUBA. Documentário. Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (Argentina). 2005.
SANTOS, F. L. B. “Para onde vai a Revolução Cubana? Dilemas do socialismo primitivo”. In: SANTOS, F. L. B. Uma história da onda progressista sul-americana (1998-2016). 1. ed. São Paulo: Elefante, 2018
VASCONCELOS, J. S. ; DESSOTI, F. ; SANTOS, F. L. B. . Cuba no século XXI. Dilemas da revolução. 1. ed. São Paulo: Elefante, 2017.
Cuba sem bloqueio: a revolução cubana e seu futuro, sem as manipulações da mídia dominante. Livro escrito pelo jornalista Hideyo Saito e pelo publicitário Antonio Gabriel Haddad.
ISTOÉ DINHEIRO. BNP Paribas se dispõe a pagar multa recorde por violar embargo dos EUA, 29 jun. 2014. Disponível em: . Acesso em: 14 jan. 2021.
Sim…mas muitos não sabem a manipulação dos EUA quando o interessa
Lendo o blog eu encontrava sempre a Sandra cozinheira e a Sandra ativista. Mas existe uma Sandra linguista que eu descobri depois que você contou que estudou Linguística na faculdade. Hoje eu encontro a Sandra linguista em cada post.
Eu deixei a carreira de linguista, mas a linguista nunca me deixou 😉
Testei hoje e amei a combinação! Obrigada, Sandra! Esse blog é uma preciosidade!
Obrigada, Bárbara <3
Finalmente fiz a receita! Estamos com uma carência de tahine na minha cidade. Não se acha os artesanais em lugar nenhum. Só dá pra comprar aqueles caríssimos importados, e aí não precisa nem falar que é impossível no Brasil de Bolsonaro. Enfim! A receita é maravilhosa! Amei!