Manter a serenidade diante de tanta crueldade e indiferença é um desafio, mas é necessário – Entrevista com Lobo Pasolini

Alguns meses depois de ter criado o Papacapim um blogueiro brasileiro deixou um comentário aqui dizendo que tinha achado o meu blog muito bom e que tinha linkado do dele. Fui conferir o blog dele e a mesma coisa aconteceu: gostei do blog dele e linkei do meu. O blog, de direitos animais, se chama ‘Lobo Repórter’ (adoro esse nome) e o blogueiro em questão é Lobo Pasolini. Isso foi em 2010 e desde então acompanho o trabalho dele e vez ou outra trocamos mensagens. Apesar de nunca tê-lo encontrado pessoalmente, gosto de pensar que ele é um amigo virtual. Criei até uma receita especialmente pro aniversário dele em 2012. Nós temos várias coisas em comum (como ser ‘homus-sexuais’, por exemplo:) e fiquei muito feliz quando ele aceitou fazer parte da série ‘Porque me tornei vegano”. É uma honra imensa pra mim receber Lobo Pasolini aqui.

Quando você se tornou vegano e o que te levou a adotar esse estilo de vida?

Eu me tornei vegano em 2008, literalmente da noite para o dia após assistir o vídeo Meet Your Meat, produzido pela PETA. Hoje em dia eu até discordo dos métodos da ONG em alguns casos, e não assisto mais esse tipo de material, mas devo a eles esse tratamento de choque que, no meu caso, funcionou.

Quais foram as maiores dificuldades que você enfrentou durante a transição?

Não posso dizer que tive alguma. Talvez a administração da turbulência emocional que essa tomada de consciência ocasione tenha sido o mais difícil e, de certa forma, continua sendo. Como todo ativista por justiça, manter a serenidade diante de tanta crueldade e indiferença é um desafio. Mas é necessário para que sejamos felizes, conscientes e eficientes ao mesmo tempo.

Qual a parte mais difícil do veganismo pra você (equilibrar dieta, comer fora, eventos sociais…)? 

Eventos sociais são os mais difíceis, pois raramente eles têm comida vegana. Eu sempre como antes ou carrego algum tipo de castanha para lidar com a possível falta de comida em uma hora que provavelmente sentirei fome. Faltando isso, tomo muita água.

O que te inspira (pessoas/organizações/ações/movimentos) no terreno do veganismo/direitos dos animais?

Eu admiro muito o trabalho do Rancho dos Gnomos, da Anda, que eu participo, do Veddas, o Papacapim pelo ativismo lindo na área de culinária vegana. Gosto muito do trabalho da Friends of Animals nos Estados Unidos, dos santuários que acolhem animais refugiados de alguma situação de abuso e todos os veganos anônimos que juntos formam essa nova consciência civilizatória. O veganismo me inspira como ser humano e adoro a sensação de estar na vanguarda de um novo pensamento.

Desde que você se tornou vegano, teve algum momento (ou vários) em que você duvidou da pertinência do veganismo? Algum tipo de pensamento ou experiência que te deu vontade de jogar a toalha? Se sim, o que fez com que você continuasse achando o veganismo o melhor caminho pra você?

Nunca. Pelo contrário, minha convicção de que o veganismo é o caminho para um futuro harmônico fica cada vez mais forte.

Qual a sua opinião sobre laticínios orgânicos, happy meat, matar animais de maneira ‘humana’ e ovos de galinhas criadas em liberdade? 

Sou contra. Eles são o equivalente do greenwash no ambientalismo, a fachada falsa de sustentabilidade. É marketing puro e uma traição dos animais. Não existe exploração gentil.

Quais os conselhos que você daria pra quem está pensando em se tornar vegano?

Não perca tempo – faça isso agora! Leia bastante teoria vegana, informe-se sobre nutrição para dominar o básico e abra sua mente para novos sabores e combinações de comida. Comida vegana é deliciosa e variada, abrace a aventura gastronômica. Seja curioso e pense com a sua própria cabeça. Foque na ética.

Como você se relaciona com pessoas onívoras? Você evita falar de veganismo, ou, pelo contrário, leva o ativismo pra todos os lugares e não perde a oportunidade de sacudir o carnismo do pessoal?

Eu raramente toco no assunto. Em geral as pessoas me perguntam e daí eu falo da forma mais acessível e sofisticada possível. Eu reservo meu blog e as redes sociais para o discurso ativista. A gente tem que ser estratégico e evitar proselitizar. Quanto mais atraente e interessante formos, mais atraente e interessante o veganismo parecerá. Eu me preocupo muito com esse branding do veganismo através da minha inserção social.

Se eu pudesse passar um dia na sua cozinha, o que encontraria no seu prato (da hora que você acorda até a hora de ir pra cama)?

Eu começo o dia com aveia, que me dá muita energia. Consumo com algum tipo de leite vegetal, em geral soja ou amendoim. Como muita couve, abobrinha, abóbora, quiabo, vagens, verduras em geral e frutas. Cresci na roça, catando frutas em árvores e isso ficou comigo. Adoro grãos e sementes como quinoa, arroz integral, gergelim, linhaça e castanhas em geral. E, principalmente, sou um homus-sexual assumido. Não vivo sem, adoro o gosto, adoro a energia que me dá e sua versatilidade. O homus é, a meu ver, um dos melhores amigos nutricionais do vegano.

Você está no corredor da morte. Qual a sua última refeição (pode ser vegana ou não. Você vai morrer, então a polícia vegana te perdoa:)? 

Arroz integral e feijão preto. Nada bate essa combinação. Ou um bom suco verde com uma sobremesa crudívora a base de fruta. Ou ainda pão árabe com homus e uma rodela de limão.

Alguma receita simples e saborosa pra dividir com os meus leitores?

Como não poderia deixar de ser, vou dar uma receita básica de homus.

Ingredientes:

250g de grão de bico

2 dentes de alho

Água em que o grão de bico foi cozido

Limão

Tahine (que pode ser comprado pronto no supermercado)

3 colheres de sopa de tahine (pasta de gergelim)

Coentro

Sal

Azeite

Como fazer

Amacie o grão de bico deixando-o de molho em água na véspera da preparação. No dia seguinte cozinhe-o em panela de pressão por cerca de 20 minutos. Escorra-o e depois bata no liquidificador com um pouco da água em que foi cozido. A textura que buscamos é a de um patê. A partir daí vá experimentando com textura e sabor, acrescentando alho, azeite, tahine, gotas de limão, coentro e qualquer outro condimento que desejar (pimenta picada, por exemplo). Continue batendo no liquidificador e testando até atingir a consistência desejada. Tire do liquidificador e coloque em um recipiente adequado. Guarde na geladeira e consuma em até três dias. Pode acompanhar saladas, pão sírio, torradas etc.

 Aviso: vicia e impressiona visitas – ótimo para reuniões de amigos.

Acompanhem o trabalho de Lobo no blog Lobo Repórter, no Facebook ou Twitter.

12 comentários em “Manter a serenidade diante de tanta crueldade e indiferença é um desafio, mas é necessário – Entrevista com Lobo Pasolini

  1. Olá Sandra, estou em São Paulo e vou agora assistir ao filme OMAR na mostra de filmes árabes no Cinesesc. É uma forma de conhecermos mais sobre tudo que está acontecendo no Oriente Médio!

  2. Sandra, muito obrigado pela oportunidade e sim, te considero uma amiga. Essa possibilidade da internet de promover encontros de mentes e corações é um dos aspectos da rede que eu mais amo. Parabéns pelo seu blog, é uma grande honra fazer parte dele. Beijos!

  3. Sandra adorei esse post! Ha uns tempos enviei lhe um e-mail com questões sobre levain mas não me chegou a responder. Acha q me pode enviar algumas informações pf? Obrigado

  4. De fato acho que o riso fácil que ficou nos meus lábios ao ler a entrevista será o que me fará lembrar dela. Leve, simples e direta. Sem pedantismo mas, elegante, como toda ação que é respeitosa. Grata Papacapim e Lobo Reporter. Hare _/\_

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