Desastres e sucessos

Gazpacho

Felizmente, poucas receitas viraram desastre nas minhas mãos. Claro que não estou contando com minha tentativa de fazer patê com salsicha e cebola crua, afinal eu era criança, não sabia o que estava fazendo e achei o resultado ótimo. Estou me referindo às vezes em que tentei preparar algo e acabei com uma porcaria que só o lixo aceitou engolir. Acho que devo isso ao fato de ser uma cozinheira sensata. Tenho um certo conhecimento gastronômico, mesmo nunca tendo feito curso sobre o assunto, e uma boa dose de intuição culinária. Não colocaria, por exemplo, mangericão em um prato marroquino, nem curry em uma feijoada. Claro que às vezes preparo pratos que não merecem que eu repita a receita, mas é raro sair algo intragável da minha cozinha. Deve ser por isso que me lembro tão bem dos desastres. Meu primeiro gazpacho foi um deles.

Em Paris, morei seis anos em uma quitinete de 14m² embaixo do teto de zinco de um prédio muito velho. No verão, o zinco esquentava tanto que sempre fazia mais calor dentro de casa do que na rua. Eu combatia o calor insuportável com um ventilador, bacias de água espalhadas pelos cantos (pra umedecer o ar), roupas molhadas (entrava vestida no chuveiro e me deitava na cama ensopada) e copos e mais copos de gazpacho gelado. Eu sempre comprava gazpacho pronto na seção refrigerada do supermercado e um dia pensei “Como toda comida feita em casa é superior à comida comprada pronta, por que não fazer meu próprio gazpacho?”. Fiz uma pesquisa rápida na internet e fui pra cozinha armada de uma das receitas que tinha encontrado. A lista de ingredientes tinha tomate, pepino, pimentão, muito alho e uma cebola inteira (crua)! Achei aquilo cebola demais, mas, contrariando o hábito de sempre escutar minha intuição culinária, fui em frente. Sem surpresas, cada gole do gazpacho era como morder uma cebola crua. Foi a primeira vez que achei a versão industrializada de um prato superior à versão feita em casa. Joguei tudo fora e voltei a comprar caixinhas de gazpacho no supermercado. Foi tão frustrante que esperei até o ano passado pra dar uma segunda chance ao gazpacho caseiro.

Pra quem não conhece esse prato espanhol, se trata de uma sopa de tomate servida gelada durante os escaldantes meses do verão. Além de ser delicioso, leve e super refrescante, é uma ótima maneira de aumentar o seu consumo de vegetais: gazpacho é, basicamente, uma salada crua liquidificada. Os ingredientes não podiam ser mais simples, não precisa cozinhar (o que é muito apreciado quando o calor aumenta) e exige poucos minutos de trabalho. Depois é só deixar esfriar na geladeira (ou no congelador, se você for impaciente como eu) e degustar bem gelado. Esforço mínimo e uma recompensa máxima, o que mais pedir?

Muitas receitas usam um pouco de pão dormido pra ajudar a emulsificar a sopa. Eu não uso porque acho que não é necessário. Despejar o azeite em fio, com o motor do liquidificador funcionando, é suficiente pra deixar a sopa cremosa e aveludada. Outra razão pra deixar o pão de fora é que prefiro um gazpacho totalmente cru: acho mais leve e digesto. Depois de várias tentativas, finalmente sou capaz de fazer o gazpacho dos meus sonhos, aqui mesmo na minha cozinha. Muito melhor do que a versão em caixinha.

Gazpacho

Tradicionalmente essa sopa é preparada com vinagre de xeres. Eu nunca tive a sorte de ter esse ingrediente espanhol na minha despensa, então uso uma mistura de vinagre balsâmico e de cidra. Eu acho que gazpacho precisa de uma dose moderada de tempeiro, mas adapte a quantidade de alho e cebola ao seu gosto. Sugiro que você comece com as quantidades indicadas, prove e aumente se achar necessário. Mas vá com calma pra não acabar com um desastre culinário, como aconteceu comigo.

5 tomates bem maduros

1 pepino médio

1 pimentão vermelho

1 dente de alho picado

2cs de cebola picada (de preferência roxa)

2cs de vinagre de xeres (eu uso 1cs de vinagre balsâmico e 1cs de vinagre de cidra)

3cs de azeite

sal e pimenta do reino à gosto

Pra servir (opcional)

1 tomate picadinho (sem sementes)

½ pepino pequeno picadinho

½ pimentão pequeno picadinho

1cs de cebola roxa picadinha

Retire a pele dos tomates usando seu método preferido. Esse é o meu: espete o tomate com um garfo e passe-o na chama do fogão durante alguns segundos, de todos os lados, até a pele estalar e ficar ligeiramente carbonizada. Deixe esfriar um pouco e puxe a pele com os dedos (ela vai se soltar facilmente). Se quiser fazer uma sopa 100% crua, use os tomates com pele e passe a sopa pronta em uma peneira bem fina. Descasque o pepino e corte em pedaços médios. Retire as sementes do pimentão e corte também em pedaços médios. Coloque todos os ingredientes, menos o azeite, no liquidificador e triture até ficar homogêneo. Com o motor ligado na velocidade mais alta, despeje o azeite em fio pra emulsificar a mistura. Prove e corrija o sal. Deixe algumas horas na geladeira antes de servir (use o congelador se estiver com pressa). Sirva bem gelado, em cumbucas pequenas, decorado com os legumes crus picadinhos. Também pode ser servido em copinhos (nesse caso deixe a decoração de fora, fica mais fácil beber a sopa). Rende aproximadamente 800ml (4 porções pequenas).

14 comentários em “Desastres e sucessos

  1. Olá,

    Sempre leio suas receitas e fico muito a fim de fazer, mas falta tempo…
    Nessa, especificamente, fiquei num dilema: eu detesto pepino. Seria um crime muito grande se eu simplesmente o excluísse do gazpacho? Ou uma solução seria substituir por alguma outra coisa?

    Parabéns pelo blog, adoro!
    Bjs

    1. Pergunta dificil… Pra ser bem sincera pra mim pepino tem gosto de nada, logo eu acho que o gosto desaparece completamente no produto final. Creio que o pepino entra aqui mais pra aumentar a quantidade de agua da sopa, mas talvez eu esteja errada. Minha sugestão seria testar uma vez com um pepino pequeno e ver no que da. Se seu horror a pepino for realmente intenso, coloque mais tomate e juro que não direi a ninguém que você fez gazpacho sem pepino.

      1. Ergh… Sim, meu horror a pepino é realmente intenso! Acho ótima essa solução de simplesmente limá-lo da receita. Quando como alguma coisa com pepino, sem saber, fico lembrando uns dois dias que comi pepino, me dá meio que um refluxo, terrível!
        Então ficamos combinadas assim: eu faço o gazpacho sem pepino e te conto depois se ficou bom. Vc não contra pra ninguém… hehehehe
        Abração

  2. Eu já tive alguns desastres culinários, viu…
    Eu gosto de experimentar receitas novas, tentar fazê-las, mas não tenho muuuuitos conhecimentos, então normalmente sai aquela coisa meia-boca.
    O maior desastre até hoje foi a tentativa de fazer cupcake. A primeira leva murchou, ficou igual quando abre o forno e o bolo ainda não cozinhou, sabe? Foi tudo pro lixo. A segunda leva ficou linda e com um sabor intragante, ficou extremamente doce (e olha que eu adoro doce, hein), fiz a receita toda vegana, usei uma receita que vi em um blog, para a cobertura, dizia que ficava durinha, tipo chantilly. Eu coloquei um ingrediente que usa em sorvete (acho que é emulsificante, não sei mesmo, hehe) mais que o indicado e mesmo assim ficou uma pasta branca e estranha em cima. Foi tão traumarizante que nunca mais tentei fazer (isso já faz um ano).

    Sobre a sua receita (que eu sou uma matraca e ainda não comentei sobre ela) quando eu vi a foto achei que fosse doce, hahaha! Nunca comi gazpacho, parece ser uma boa idéia (e saudável) para dias de calor. E tem horas que é melhor seguir a intuição mesmo, ainda mais vc que entende do assunto!! Bjs.

    1. Confesso que quando vi gazpacho pela primeira vez achei muito estranho isso de tomar sopa gelada, mas depois que experimentei virei fã. é sempre bom expandir nossos horizontes culinarios. Mas doce com cebola e tomate cru por cima, bem ainda não expandi meus horizontes tanto assim:-)

  3. Querida irmã…. nunca comi gazpacho! Como a colega la de cima, acho estranho uma sopa gelada. Muito embora, more em um país mais q quente e este prato caia como uma luva para nós!
    Enfim, vou fazer pro povo daqui de casa. Comerei e depois te direi o veredito. Afinal, lembra qd vc fez guacamole e eu não queria comer pq odiava (ainda odeio) abacate. Mas, vc me explicou q aqui abacate no Brasil é sempre doce e eu deveria experimentá-lo salgado e so então tirar minhas conclusões… resultado: sou uma big fan de guaca. Ontem, inclusive, fiz um monte de guaca e todos nós comemos como uma linda família feliz!!!
    Bem, quero fazer essa sopinha geladinha e saber se é bom mesmo!!!!!!!
    Bjos querida, salve salve irmã Sandra!!!

    1. Pois você acredita que aqui a heresia é comer abacate doce? O povo so falta cair pra tras quando digo que no Brasil tomamos vitamina de abacate. Tudo depende do ponto de vista, até as heresias…

  4. Eu aprendi a comer (e me acostumar) gazpacho quando vim morar na Espanha!
    Realmente no verão, não tem coisa melhor que comer essa sopa fresquinha. Aqui tem gente que toma no copo mesmo, como um suco. Eu prefiro comer em uma tigela funda e colocar um pouquinho de pão tostado em quadradinhos.

    Quanto ao abacate, agora que estou começando a comer-lo salgado mas ainda é muito estranho pra mim….rs. Uma vez ouvi dizer que o Brasil é o unico lugar que se come o abacate doce!!!!!! Eu ainda prefiro ele em uma boa vitamina ou amassadinho com limão como fazia minha mãe. Ohhhh saudades!!!!!

    Beijos

    Katia

    1. Eu também tomo gazpacho no copo. Nada mais refrescante do que chegar em casa morta de calor e tomar um copo de gazpacho geladinho! Abacate é consumido doce em varios paises da Asia também. Vitamina de abacate com leite e leite condensado é super popular por la. Parece que na Indonésia eles colocam um pouco de café na vitamina, mas isso me parece mais estranho do que abacate salgado.

  5. Acabei de me esbaldar…tô tão orgulhosa por ter deixado a preguiça de lado e ter me dado a oportunidade de experimentar a famosa “sopa fria”,rs. Muuuito obrigada pela receita!!!!!!!!! Ficou deliciosamente saudável e diferente de tudo que já experimentei 🙂

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