“Quando penso em veganismo, penso em justiça”

Em julho eu contei que tinha voltado a entrevistar pessoas veganas, algo que comecei muitos anos atrás, aqui no blog. Mas dessa vez faço apenas três perguntas e entrevisto somente pessoas que não são brasileiras, pois o objetivo é mostrar que o veganismo lá fora segue forte como movimento político, apesar do veganismo liberal de ONGs e influenciadoras tentar nos convencer do contrário.

A entrevistada de hoje é Ahlam, uma palestina incrível que está construindo o movimento antiespecista e feminista na Palestina, enquanto segue resistindo a colonização de seus territórios e lutando pela autodeterminação do seu povo. Sim, é possível ser vegana e se importar com mais de uma causa! Não só possível, como coerente com a luta antiespecista.

O que é veganismo?

O veganismo é dizer NÃO à opressão em sua forma menos notada: especismo. Quando penso em veganismo, penso em justiça. Justiça pra todas as almas esmagadas, privadas de qualquer meio de se defender, exceto através da nossa voz.

Por que você se tornou vegana?

Sempre me peguei pensando no que fazemos aos animais enquanto eu refletia, falava ou escrevia sobre outras causas, principalmente o feminismo. A comparação era tão evidente e chocante. Nós discriminamos uns aos outros com base no gênero, religião, cor, status social, etc. e discriminamos animais com base no fato deles não serem humanos. Como uma mulher que vive sob ocupação militar (israelense) e em uma sociedade patriarcal, as camadas de opressão e discriminação que sofri abriram meu coração, de muitas maneiras, pra ver a opressão que outros animais humanos e não humanos sofrem na Palestina e no mundo em geral.

Anos antes de me tornar vegana, escrevi um artigo expressando minha raiva pelo linchamento de um jovem, membro de uma minoria religiosa no Egito, por uma multidão de extremistas. Concluí que linchamentos, um castigo cruel e uma maneira de intimidar um grupo, só iriam parar quando nós parássemos de lidar com a matança de pessoas como uma parte normal da vida, algo inevitável em guerras e conflitos. Foi então que me dei conta que a matança de pessoas não terá fim enquanto a matança de animais continuar. Porque quando você mata um animal, você normaliza o ato de matar.

Hoje eu lembro de muitos momentos veganos que experimentei ao longo dos anos, como quando fui forçada a dar uma mordida na carne de Misho, o cordeiro que criamos desde o nascimento. Eu não consegui engolir. Isso foi há oito anos e foi a última vez que coloquei carne de cordeiro na boca. Outro momento vegano, três anos atrás, foi quando estava preparando ovos caipiras e encontrei sangue dentro de um deles. Tinha um pinto começando a se formar ali. Eu não podia mais ignorar aquilo e me tornei vegana logo depois.

Como derrubar o especismo?

Com educação. Nosso sistema educacional é especista, da mesma forma que é sexista e classista. As aulas de ciências são terrivelmente especistas. Afirmam, por exemplo, que animais fazerem parte da cadeia alimentar, que humanos devem comer não-humanos. E reforçam o mito de que se não comermos animais, eles vão superpovoar a Terra, comer todas as plantas e nós morreremos de fome. Sem falar nas aulas de religião onde o mito de que “os animais foram criados pro nosso uso” é repetido de várias maneiras.

Transformar o sistema educacional é o objetivo. Envolver crianças e jovens em atividades intersetoriais é o caminho a ser seguido.

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