Ano passado publiquei um post mostrando o que eu comia em uma semana e foi um grande sucesso por aqui. Naquele momento eu estava morando em Natal e as comidas que apareceram no meu prato refletiam meu modo de vida por lá e, principalmente, a oferta de alimentos locais, naquela estação. Por isso achei importante voltar com mais uma “semana de refeições” agora que estou num ponto do globo muito distante de cajueiros e plantações de macaxeira: o distrito 93, que fica na periferia norte de Paris, França.
Apesar do estilo das minhas refeições ser diferente quando estou na França (por exemplo, quase sempre faço pratos completos, tudo misturado, e não o esquema de pf no Brasil com feijão+arroz+verdura cozida+salada) sigo a mesma linha de alimentação aqui. Não tenho acompanhamento de nutricionista, não calculo macro nutrientes nem peso comida e ainda não aderi à obsessão mundial por proteína, que já entrou na cabeça de muitas veganas “fitness”. Embora eu prepare minhas refeições com intenção de nutrir o meu corpo e cuidar da saúde pra seguir na peleja da vida e da militância, eu como o que eu gosto e me dá prazer. Tenho a imensa sorte de amar verdura, de achar fruta a sobremesa mais perfeita, de não gostar de frituras nem sentir necessidade de comer doces. Que mais? Feijão é a minha comida preferida, junto com favas e as outras leguminosas, e não bebo suco (prefiro comer a fruta).
No momento estou incluindo mais alimentos à base de soja na minha alimentação porque entrei na peri-menopausa (pré-menopausa) e a soja tem muitos benefícios pra quem está atravessando essa fase…desafiadora. Detalhe importante: todos os alimentos à base de soja que você vai ver aqui foram feitos com soja orgânica, não transgênica, cultivada na França e ainda assim priorizo os fermentados (iogurte natural) e minimamente processados (tofu, leite).
Aproveito pra dizer que todos os vegetais frescos aqui foram cultivados na França ou, em alguns casos, na Itália ou Espanha. Idem pros cereais (aveia, trigo, arroz, cevada, quinoa) e sementes/castanhas (amêndoas, chia, girassol, jerimum). É algo importante pra mim e isso acaba reduzindo um pouco as opções. Nos supermercados da Europa tem quase tudo o ano inteiro, porque importam qualquer coisa de qualquer país (abacaxi do Kenya, kiwi da Nova Zelândia, manga da Índia, limão do Brasil, abacate do Peru, uva do Chile…), mas me recuso a participar dessa insanidade. Até porque, mesmo com as opções limitadas, ainda tem muita coisa pra comer por aqui e nos países vizinhos. Essa época do ano é um pouco difícil porque os vegetais de inverno acabaram, mas os vegetais de verão ainda não chegaram de vez. Mas depois de ver as fotos todas juntas vi muita diversidade e pensei que, realmente, não tenho do que reclamar.

Segunda-feira
Café da manhã: aveia dormida (com chia e leite de soja), iogurte natural de soja, compota de maçã (sem açúcar, feita por uma amiga), pasta de amêndoas, 1 castanha da Amazônia + café (sempre amargo). Almoço: salada completa com cuscuz de cevada (no estilo do cuscuz marroquino, que é de trigo), pepino, funcho, repolho roxo, tofu defumado e repolho fermentado (chucrute), temperada com limão e azeite. Jantar: sopa de lentilha coral, arroz e brócolis, salada de endívia, laranja e semente de jerimum tostada.
Eu falei que tento comprar comida que cresce por aqui, mas claro que o café e a castanha da Amazônia vêm de longe. Adoro chucrute, e todo tipo de legume fermentado, e acho importante incluir alimentos fermentados na minha alimentação cotidiana (a flora intestinal agradece). Um informação sobre as saladas que acompanham minhas refeições: prefiro sem tempero nenhum, nem molho nem azeite.

Terça-feira
Café da manhã: aveia dormida (com chia e leite de soja) com ameixa passa, pasta de amêndoas, 1 castanha da Amazônia e canela + café Lanche da manhã: pão de fermentação natural com nozes, queijo de tofu + cappuccino com leite de aveia. Almoço: mistura de leguminosas (feijão vermelho e branco, grão de bico e ervilha seca) com tomate e abobrinha, salada crua de pepino, repolho roxo e rabanete preto (só a casca é preta) e chucrute. Lanche da tarde: pão de fermentação natural com nozes, queijo de tofu e salsicha de tofu com mostarda de Dijon. Jantar: foul (pasta de fava marrom com tahina e cominho), mâche (um tipo de alface), pepino e funcho + iogurte natural de soja e laranja.
Eu amo ameixa passa e aqui elas são vendidas sem açúcar (não é ameixa em calda!). A receita do queijo de tofu já apareceu aqui no blog e recomendo demais. Essa salsicha também é feita de tofu (75% da salsicha é tofu) com óleo de girassol, alguns vegetais e temperos. É algo que não como com frequência, porque é mais caro do que feijão e arroz e porque é um alimento pra comer em ocasiões especiais, mesmo. Ainda não tem tomate fresco por aqui, então ainda estou usando tomate de lata (100% tomate e nada mais) ou extrato de tomate (também 100% tomate) pra temperar meus pratos.
Quarta-feira
Café da manhã: esqueci de fotografar, mas foi minha amada aveia dormida com maçã. Almoço: mexidão de arroz integral com proteína de soja temperada com tomate e ervilha torta (da nossa horta), salada com mâche (um tipo de alface), pepino, rabanete preto e chucrute. Jantar: macarrão integral com molho de tomate, abobrinha e queijo de tofu, salada de mâche, rabanete e laranja.
Momento histórico: em 15 anos de blog, essa foi a primeira vez que proteína texturizada de soja (PTS) apareceu aqui. Eu não gosto do sabor, por isso a ausência dela nas minhas receitas. Semana passada comprei um pacotinho de PTS orgânica e resolvi dar uma chance pra bichinha, mas sigo sem gostar do sabor. Agora não sei como vou fazer pra dar cabo do pacote que está no armário.

Quinta-feira
Café da manhã: aveia dormida (com chia e leite de soja), maçã, iogurte natural de soja, pasta de amêndoas e 1 castanha da Amazônia, pão de fermentação natural com nozes e queijo de tofu + café. Almoço: o resto do macarrão de ontem, cenoura e pepino, foul (pasta de fava). Jantar: rolinhos de verão com molho de amendoim
Esqueci de fazer uma foto do jantar, porque recebi amigas pra jantar com a gente aqui em casa e não uso o telefone quando tenho companhia, mas coloquei uma foto do post onde explico como fazer esses rolinhos maravilhosos (com muitas, muitas verduras cruas, tofu e um molho de amendoim e gengibre de cair da cadeira de tão gostoso) pra vocês saberem do que estou falando.
Sexta-feira
Café da manhã: grãomelete fermentado, baguette de fermentação natural + café Lanche da manhã: aveia dormida (com chia e leite de soja), mirtilo, iogurte natural de soja, pasta de amêndoas e 1 castanha da Amazônia. Almoço: os restos dos vegetais (rabanete, pepino, cenoura, alface e hortelã) e molho de amendoim dos rolinhos do jantar de ontem, mais macarrão de arroz (também do recheio dos rolinhos) esquentado na frigideira (quase uma panqueca) + iogurte natural de soja com mirtilos. Lanche da tarde: cenoura e funcho crus, foul (pasta de fava e tahina), pão assado (na frigideira) com azeite e laranja. Jantar: lentilha com uma mistura de vegetais do nosso lote nos Jardins Operários (urtiga branca, folha de malva, hera terrestre e cebolinha) + salada com acelga verde, folha de dente de leão, azedinha e uma alface selvagem (tudo do nosso lote), maçã e nozes, temperada com melado de romã (da Palestina) + morango com melissa e flores de borragem (também do nosso lote).
Passamos a tarde, Anne e eu, cuidando da horta nos Jardins Operários, então aproveitei pra colher os ingredientes do jantar. Adoro incluir plantas selvagens (plantas comestíveis tradicionais – antigamente conhecidas como PANCs) na minha alimentação. Tanto porque o sabor é interessante, quanto pra aumentar ainda mais a variedade da minha dieta.
O iogurte que compro aqui é realmente natural: sem açúcar e sem nada além de soja orgânica, água e bactérias pra fermentar o leite. Acho uma pena os iogurtes vegetais no Brasil serem todos adoçados e cheios de ingredientes estranhos.
Os morangos da nossa horta são miudinhos e perfumados e tive a ideia de misturar com folhas de melissa e achei a combinação maravilhosa (da próxima vez vou só diminuir a quantidade de folhas, pois tinha mais melissa que morango).
Sábado
Café da manhã: aveia dormida (com chia e leite de soja), maçã, pasta de amêndoas e 1 castanha da Amazônia + café. Almoço: mistura de leguminosas (feijão vermelho e branco, grão de bico e ervilha seca) com tomate e coentro, cuscuz de cevada, salada com acelga verde, alface, azedinha, folha de dente de leão, semente de jerimum tostada e chucrute. Lanche: 1/2 sanduíche com “atum” vegetal (à base de proteína de ervilha e algas), rúcula e cebola roxa e 1/2 fatia de quiche de legumes. Jantar: sopa de lentilha rosa (só lentilha, cebola, cominho, e limão) com coentro, rabanete e cubinhos de pão tostado no azeite.
Fui pra Paris com Anne e passamos do lado de uma padaria 100% vegetal que vende muita coisa gostosa. Esse sanduíche de “atum vegetal” é assustador de tão parecido e as quiches são deliciosas. Recomendo muito esse lugar pra quem estiver de passagem por Paris, se chama Land&Monkeys. Mas nesse dia Anne passou mal e à noite ela me pediu um prato que sempre cura as doenças dela (e as minhas): sopa de lentilha palestina, feita com lentilha rosa, cominho e muito limão. Depois do jantar ela já estava boazinha. (Fiz uma versão simplificada dessa receita, sem arroz e sem alho).
Falei que kiwi aqui vem da Nova Zelândia, mas esses que aparecem na minha mesa vieram da Itália. De todas as frutas, kiwi é uma das que eu menos gosto e foi a primeira vez na vida que comprei kiwi. Mas como a oferta de frutas que cresce por aqui é pequena no momento (vai melhorar quando o verão chegar com todas as suas frutas suculentas), eu acabei trazendo uns kiwis orgânicos pra casa pra variar um pouco (senão era só laranja e maçã todo dia).
Domingo
Café da manhã: tofu mexido com tahina e limão, pão de fermentação natural + café. Almoço: mutabbal (pasta de berinjela defumada) com baguette de fermentação natural e rabanetes. Jantar: soba (macarrão de trigo sarraceno) no leite de soja e tahina, tofu defumado e coentro, salada de favas verdes com laranja e semente de girassol. Ceia: pão de fermentação natural com queijo de tofu, kiwi e iogurte natural de soja.
Passei o dia nos Jardins Operários, cuidando do nosso lote junto com camaradas do coletivo. Queria ter preparado o almoço pra levar, mas preferi encher o bucho de tofu de manhã e tomar vários cafés enquanto conversava com Anne (domingo só presta se começar assim). Então só deu tempo de fazer um mutabbal, lavar uns rabanetes e pedir pra uma camarada levar pão. Claro que quando saí dos jardins, às 16h, já estava morrendo de fome. Então jantamos cedo, por volta das 17h, e antes de dormir fiz uma ceia leve. O prato do jantar pode parecer estranho, mas é a minha obsessão há meses! Me inspirei de um prato maravilhoso servido num restaurante japonês vegano de Paris e desde que descobri que conseguia fazer uma versão simplificada em casa, como isso pelo menos uma vez por semana.
Termino esse post com as duas colheitas que fiz durante a semana na nossa horta coletiva (espere até o verão chegar, com seus tomates e abobrinhas, e a colheita vai ser muito mais impressionante!). Tudo isso apareceu no cardápio que mostrei acima. E não fotografei, mas também consumi bastante keffir (de água) feito por mim mesma e vários pedaços de chocolate 100% cacau.
Bônus
Acima, duas refeições que fiz antes de começar a documentar todo que comi na última semana. Na esquerda tem um banquete feito pela minha amiga (e vizinha de lote nos Jardins operários) Lila, que é síria e cozinha maravilhosamente bem. Aqui tem salada de favas (maduras), fatush (salada de legumes crus com pão pita frita no azeite), mutabbal, taboulê (salada de legumes crus e triguilho), mais a pimenta e legumes fermentados que ela mesma prepara. Na foto da direita tem um almoço feito por mim: quinoa com brócolis, cogumelos ostra salteados, salada de repolho roxo, pepino e coentro com molho de tahina e missô + laranja.
Abaixo meu almoço de hoje: risoto com arroz integral, favas verdes (da horta) e maduras, salada de alface e cenoura crua com molho de tahina e semente de jerimum, mais iogurte natural de soja com laranja (deu pra perceber que amo essa combinação, né?). E à direita, meu chocolate preferido. Gosto de chocolate 100% (totalmente amargo) e esse aqui é um desbunde! Mas chocolate é comida de luxo e só como um quadradinho por vez. Felizmente o sabor é tão intenso que me satisfaz totalmente. Essa barra de 100g (dividida em 24 quadradinhos) dura um mês inteiro, se eu estiver comendo sozinha.
Oi Sandra!
Que banquete para os olhos suas refeições!
Na minha rotina exaustiva de CLT quase nunca consigo variar assim, é comum comer vários dias a mesma coisa (preparo porções grandes pra não precisar cozinhar todo dia), mas me inspira demais os pratos que você demonstra, e também abre a mente para novas combinações e possibilidades.
Há tantos anos que aprendo com você, deixa eu tentar retribuir: sobre a PTS, algumas dicas podem melhorar um pouco a experiência com ela, para que consiga aproveitar o pacote que já tem aberto.
Por exemplo, deixar de molho em caldo de legumes já ajuda a reduzir um pco o gosto de “ração”, e para espremer, faz diferença usar um pano ao invés de só a mão / uma peneira (bota tudo dentro de um pano de prato e aperta, até ficar sequinha).
Depois, refogar bem com bastante cebola e acrescentar muitos temperos (se possível, azeitonas também) já deixa “no grau”.
Caso queira, modelar almôndegas (dando liga com aveia ou alguma farinha / pão) e botar no molho talvez te conquiste de vez…rs
até mais!
Karine
Adorei as dicas pra preparar a PTS, Karine. Muito obrigada 🙂 Vou testar na versão almôndega e te conto como ficou.
Tá bom, vou gostar de saber!!
Sempre muito inspiradoras as suas postagens, saio com muitas ideias para as minhas próprias refeições. Se postar mais semanas de alimentação com certeza ficaremos felizes e gratas.
Pensei em fazer mais uma versão no meio do verão, pra mostrar a mudança da estação no prato. Então aguarde que vai ter mais, sim 😉
Também amo fruta com aveia no café da manhã (ou em qualquer momento do dia). Por aqui, faço mingau (sem açúcar e só com água). Não sou a maior fã de PTS, mas gosto dela num molho bolonhesa com algum vegetal junto. Por vezes também uso a PTS crua pra dar um crock no mingau. Obrigada por compartilhar tanto por aqui, Sandra! ❤️
PTS crua? Achei ousado 😀 E é um prazer seguir fazendo esse trabalho, Beatriz <3
Sandra, você me inspira muito! Lança um livro com esses relatos e fotos maravilhosas que você tira. Eu iria correndo comprar!! Continue a luta. Um grande abraço, com todo meu apoio.
Um dia esse livro sai…
Um jeito diferente que gosto muito de fazer é a PTS na farofa, frito ela no óleo/azeite pra ficar crocante (com um tiquinho de sal) e reservo. Depois frito bastante cebola coloco a farinha da preferência, deixo uns minutinhos, desligo o fogo e misturo todos os ingredientes e coloco um pouco de azeitonas. Fica bem crocante e muito bom, difícil comer pouco.
Ótima receita! Obrigada por compartilhar 😉